Voltando à minha infância, eu sempre fora alguém muito distante de tudo. Era sempre muito critico, pensativo e por isso me isolava bastante. Apesar de ser uma criança que gostava de viver isolada, tinha meus amigos, me divertia, brincava muito e ia para a escola. Aos 6 anos minha família se converteu às Testemunhas de Jeová. Lembro de não ter gostado muito da notícia, pois, lembro da minha mãe dizendo para mim em uma festa junina da escola: "Aproveite essa festa! Será a última! Jeová não aprova essas festividades". A partir daquele ano de 1987, fui inserido pouco a pouco no cotidiano de uma Testemunha de Jeová. Os rituais deles compreendem orações, estudo da bíblia e pregação nas casas das pessoas. Se alguma Testemunha de Jeová ler esse capítulo, entenda que isso é uma forma breve de descrever um religião. Sei que, e como sei, que as Testemunhas de Jeová são muito mais que isso, tanto em aspectos bons, quanto negativos também. Afinal, toda religião tem seus pontos positivos e os negativos. Aliás, em geral, o ponto negativo em toda religião, para mim, são as pessoas que nela estão. Facilmente as teorias ensinadas em qualquer templo religioso são deturpadas por aqueles que não buscam a base de toda religião que é amar a deus sobre todas as coisas e ao próximo como a ti mesmo. Até hoje não entendi porque as pessoas estudam tanto sobre tantos assuntos quando na verdade, não aprenderam esses dois pontos chaves. Bom, cada um faz da vida o que quer, inclusive eu. Aprendi que não há caminho para o crescimento espiritual. Se uma religião estuda demais e a outra nem tanto, ao menos, independente do quanto se instruem, desejo de coração que todos possam amar ao próximo e alcançar o divino.
Retomando a minha infância, eu estudava muito a bíblia. Fui aos poucos sendo afastado daqueles que eram da minha família e não pertenciam a mesma denominação religiosa que meus pais. Frequentava as reuniões três vezes por semana além dos estudos bíblicos que eram realizados em casa. Acompanhava meus pais nos trabalho de campo, ou, trabalho de pregação de casa em casa realizados aos sábados e domingos.
Um dia, deitado em minha cama, não me recordo o motivo, minha mãe estava no meu quarto e me disse o seguinte:
- Se você não consegue amar as pessoas que estão à sua volta, nunca poderá amar a Deus.
Eu era uma pessoa assídua na religião, apesar de não gostar na época daquelas obrigações como toda criança talvez tenha repulsa - abdicar das brincadeiras para fazer atividades sérias não agrada a qualquer menino. Por ser assíduo e ter em meu coração certo discernimento de que deveríamos amar a Deus, choquei-me com a declaração de minha mãe. Ainda mais por ela ter dito que eu não amava as pessoas que estavam à minha volta. Essa frase iria percorrer toda minha vida até as sessões de terapia nos meus 30 anos.
Ao longo da minha adolescência eu tive que me confrontar com diversas situações que desobedeciam aquele Deus que eu deveria seguir. Cada vez que eu não conseguia seguir os dogmas da religião, sempre me culpava por não amar a Deus suficientemente. Você se cobra tanto até chegar ao momento de quase desistir, tomar remédios querendo que tudo desapareça ou beber até que tudo se resolva. Por pouco não entrei em caminhos escuros de vicio ou morte prematura.
Eu focava tanto no que deveria fazer e não conseguia que me sentia fraco, impotente, sem possibilidade de continuar vivendo. Em meio às tristezas, chegou o dia, aos 20 anos, em que eu não aguentava mais a pressão daquela religião. Larguei tudo! Pedi para ser desassociado e fui buscar meu próprio caminho. Eu passaria pela duvida de ter largado uma religião que "seria" a única e verdadeira, depois por uma fase agnóstica até chegar ao ateísmo.
Sai de Belo Horizonte em 2004 e fui morar em São Paulo. Lá chegando, arrumei um trabalho temporário em um clinica de podologia - havia aprendido as técnicas de massagens trabalhando em uma loja da mãe de uma ex namorada. Entre uma reflexologia e outra conheci uma senhora de 70 anos que, sempre muito solicita, conversa comigo e ouvia todas minhas histórias. Depois de alguns meses comuniquei a ela que iria parar de trabalhar na clinica pois havia conseguido um estágio em minha área. Ela pediu para que eu fosse na casa dela aos sábados continuar as massagens, pois, comprovadamente durante aqueles meses eu havia curado o pé dela. Realmente aquele pé estava todo atrofiado e as massagens haviam tornado as articulações deles como eram há décadas antes e agora ela poderia ir aos bailes da terceira idade e dançar sem dor. Ela disse que eu tinha mãos de cura e que seu eu largasse a faculdade de arquitetura e fosse fazer medicina eu me daria muito bem. Como não gosto de medicina, havia ganhado uma amiga e uma possibilidade de grana extra já que o estágio pagava muito pouco aceitei o convite.
Durante os sábados em que eu ia lá ela me confessou ser espírita. No inicio ela não tocava muito no assunto, acho que ela sabia que eu, por ter sido testemunha de jeová, tinha uma aversão a tal palavra. Mas, ela, muito discreta, ia jogando algumas palavras sobre espiritualidade aleatoriamente aos meus ouvidos. Um dia eu disse: "Vou lá na Federação Espirita de São Paulo onde você frequenta!" Ela disse para eu ter calma. Ela buscaria por uma palestra que talvez me interessasse e me chamaria para assisti-la. Na próxima semana, mesmo sem o convite dela fui até a Federação. Chegando lá era uma palestra sobre o amor. Duraria 40 minutos. Sentei e aguardei que começassem. Musicas calmas, depois entrou uma pessoa no palco do teatro e começou a discursar. Ela falou sobre o amor de Deus e, sendo este um ser de amor, ele não nos puniria como algumas religiões ensinavam, somos responsáveis diretos por nossas ações. Disse que Ele nos enviou seu filho como exemplo, mas, nós, em nossa grande imperfeição, estávamos longe de sermos como Jesus. Por isso, não deveríamos ficar frustados se não formos como ele. Só pelo fato de queremos ser igual já é um grande passo. Jesus era amor em pessoa e isso era algo difícil sermos. Além de queremos ser como ele se ao menos quisermos tentar amar o nosso próximo, também já seria algo valioso perante os olhos de Deus. Depois de queremos, se amássemos realmente, seria um outro grande passo. Se além de amarmos, perdoássemos, que maravilha seria! Depois de aprender a amar e perdoar, esquecer. Uma coisa de cada vez. Para alguns, essa palestra pode parecer boba, mas, imagine para uma pessoa que se culpava a vida vida inteira por não amar a Deus e que este iria castigá-lo! Foi a primeira vez que pude respirar aliviado, pois, Deus além de ser amoroso era bondoso e daria "tempo ao tempo" para que eu atingisse, ou não, algum estágio espiritual elevado. Eu chorava tanto, mas tanto, que comecei até a soluçar. Eu que não sou de demonstrar meus sentimentos em público, por isso, fiquei morrendo de vergonha de levantar dali. A palestra terminou, fiquei 10 minutos esperando me recompor e fui embora. Nunca havia sentido tanta paz na vida. Eu jamais poderia esperar viver aquilo, sentir paz e quase um amor ou amor pelo divino.
Naquele dia, agradeci pela primeira vez a Deus por se fazer presente em minha vida.